Boy Erased – Uma Verdade Anulada tem uma história controversa aqui no Brasil. Quando o estúdio escolheu não lançar o filme nos cinemas, falou-se que seria um problema político. Na época, escrevi que não se tratava de nada disso. Simplesmente, é o tipo de filme que não vai resultar em grandes bilheterias. Mesmo tendo Nicole Kidman e Russell Crowe no elenco. Com toda a confusão da época, acabei não assistindo o filme. Mas, meu amigo José Augusto Paulo o assistiu lá na Europa, e escreveu sobre ele. A crítica está abaixo. Se você quiser ver Boy Erased, ele está disponível por aqui nas plataformas digitais, como Apple TV e Google Play, para aluguel ou compra.
Boy Erased – Uma Verdade Anulada
O que me levou a assistir esse filme foi ter gostado do trabalho de Lucas Hedge em Saída à Francesa. Mas, confesso que estava esperando um drama angustiante, uma exposição de preconceitos e inverdades, e muitos sentimentos negativos. Na verdade, o filme reflete bem a personalidade do personagem principal. Ele é honesto, correto, obediente, sem maiores arroubos emocionais. Sendo assim, diferente, agradou.
A história
A história é parecida com a que já foi contada em outros filmes e documentários. Jared, filho (Lucas Hedges) de uma família classe média, de certa forma ‘sai do armário’ por uma certa pressão dos pais (Nicole Kidman e Russell Crowe) quando algo acontece no colégio. Ele concorda (naquela de ser obediente) em participar de um ‘programa de conversão’. Assim se chamam esses seminários e retiros para ‘transformar’ homossexuais em heterossexuais. A diferença de historias semelhantes é que o pai nesta é um pastor batista. Embora seja também dono de uma revendedora de automóveis (ou seja, não vive da igreja e nem enriqueceu com esta).
A análise
Por esse resumo foi que eu esperei mais tensão e drama do que encontrei no filme. Isso se dá talvez porque a história se baseia em fatos verídicos (autobiografia de Garrard Conley). Mas também pela direção de Joel Edgerton (excelente ator, também nesse filme, e que adaptou o livro de Conley para a tela). Mas, no fim, compreendi que houve muito cuidado para que vivêssemos a história como o personagem principal. Este enfrenta quase tudo com calma, e por que não dizer, com fé. Boy Erased, ao não puxar muito pelo debate sobre o quanto a religião tem a ver com tudo que o jovem passa, também traz para o roteiro muitos dos sentimentos cristãos que ele tem. Tudo sem exageros, sem recitar dogmas, sem fanatismo. Jared demonstra, com naturalidade, compaixão, capacidade de perdão, amor ao próximo, respeito pelos pais, e fé em seu progresso como ser humano.
Porém, o filme tem seus momentos mais intensos, e um deles traz algumas observações interessantes sobre o personagem e a trama. É um ato de violência sexual. Mas até isso se mostra de forma cuidadosa, sem apelação, e a cena é, felizmente, bem rápida.
O que acontece no tal ‘programa’ chega a irritar, mas não chega a extremos. Mais parece uma terapia de grupo mal conduzida. No fim, lamentamos que esses programas existam. Fica claro que não são liderados por profissionais de saúde. E há ainda uma surpresa no final sobre o principal conselheiro no programa, também um personagem real. Só achei que o titulo original do filme dá a impressão de que algo foi anulado. Na verdade, eu diria que coisas foram alteradas, mas não anuladas.
A produção
A produção é bem cuidada. A ponto de nos passar uma certa calma que paira sobre o relacionamento equilibrado da família central, a normalidade que se vive em uma pequena cidade dos EUA, sem exageros. A direção é refinada, cuidadosa, apaziguadora até. A fotografia é gentil, sem maiores arremessos de criatividade. Mas sem deixar que o filme se transforme em uma peça de teatro filmada.
E no final…
Bem, no final, aparecem fotos da família real de Garrard Conley. É como se equiparasse com os personagens, o que agrada. Afinal, por várias formas, acabamos sentindo simpatia por essa família, quase como outra qualquer, mas nem tanto.